25 de mai. de 2012

Quem disse que o silêncio é quieto?




Quem disse que o silêncio é quieto?
O meu silêncio é povoado de tantos rumores. Preencho com suposições de diálogos, sequências absurdas de palavras que fazem fila e rodopiam em minha cabeça.
Com elas formo frases, opiniões, questionamentos, respostas,  determinações
O meu silêncio é preenchido com imagens que por vezes tentam substituir as palavras, tentando deixar o ambiente realmente mais quieto. As imagens se sobrepõe umas as outras, formando pares, contando histórias, criando intrigas, terminando e recomeçando casos.  Meus sentimentos acompanham as imagens e não permitem a calmaria chegar.
O meu silêncio tem cheiro também, cheiro de flores, cheiro dos meu quarto, dos animais que sempre me rodeiam, dos livros acumulados em todos os cantos, das pessoas que quero bem e dos momentos que me marcaram. 
O cheiro tenta ser silencioso, mas forma palavras, imagens e tudo mais impedindo a tranquilidade de ficar.
O meu silêncio ainda não é calmo, mas dizem os que entendem desta mágica, persista que o silêncio fica só. Vou persistir....

16 de mai. de 2012

DESAPOSENTAR - Domingos Pellegrini


Domingos Pellegrini
Ele chegou à praça com uma marreta. Endireitou a estaca de uma muda de árvore e firmou batendo com a marreta.
Amarrou a muda na estaca e se afastou como pra olhar uma obra de arte.
Não resisti a puxar conversa:
- O senhor é da prefeitura?
- Não, sou da Alice, faz quarenta e dois anos. Minha mulher.
- Ah... O senhor quem plantou essa muda?
- Não, foi a prefeitura.
Uma árvore velha caiu, plantaram essa nova de qualquer jeito, mas eu adubei, botei essa estaca aí.
Olha que beleza, já está toda enfolhada.
De tardezinha eu venho regar.
- Então o senhor gosta de plantas.
- De plantas, de bicho, até de gente eu gosto, filho.
- Obrigado pela parte que me cabe...
Ele sorriu, tirou um tesourão da cinta e começou a podar um arbusto.
- O senhor é aposentado?
- Não, sou desaposentado.
Foi podando e explicando:
- Quando me aposentei, já tinha visto muito colega aposentar e murchar, que nem árvore que você poda e rega com ácido de bateria...
Sabia que tem comerciante que rega árvore com ácido de bateria pra matar, pra árvore não encobrir a fachada da loja?
É... aí fica com a loja torrando no sol!
Picotou os galhos podados, formando um tapete de folhas em redor do arbusto.
- É bom pra terra... tudo que sai da terra deve voltar pra terra...
Mas então, eu já tinha visto muito colega aposentar e murchar.
Botando bermuda e chinelo e ficando em casa diante da televisão.
Bundando e engordando...
Até que acabaram com derrame ou infarto, de não fazer nada e ainda viver falando de doença.
Cortou umas flores, fez um ramalhete:
- Pra minha menina. A Alice. Ela é um ano mais velha que eu, mas fica uma menina quando levo flor.
Ela também é desaposentada.
Ajuda na escola da nossa neta, ensinando a merendeira a fazer doce com pouco açúcar e salgados com os restos dos legumes que antes eram jogados fora. E ajuda na creche também, no hospital.
Ihh... A Alice vive ajudando todo mundo, por isso não precisa de ajuda, nem tem tempo de pensar em doença.
Amarrou o ramalhete com um ramo de grama, depositou com cuidado sobre um banco.
- Pra aguar as mudas eu tenho que trazer o balde com água lá de casa.
Fui à prefeitura pedir pra botarem uma torneira aqui.
Disseram que não, senão o povo ia beber água e deixar vazando.
Falei pra botarem uma torneira com grade e cadeado que eu cuidaria.
Falaram que não.
Eu teria que ficar com o cadeado e então ia ser uma torneira pública com controle particular, e não pode.
Sorriu, olhando a praça.
Aí falei: então posso cuidar da praça, mas não posso cuidar de uma torneira?
Perguntaram, veja só, perguntaram se tenho autorização pra cuidar da praça!
Nem falei mais nada. Vim embora antes que me proibissem de cuidar da praça...
Ou antes que me fizessem preencher formulários em três vias com taxa e firma reconhecida, pra fazer o que faço aqui desde que desaposentei...
Ta vendo aquele pinheiro fêmea ali?
A Alice que plantou.
Só tinha o pinheiro macho. Agora o macho vai polinizar a fêmea e ela vai dar pinhões.
- Eu nem sabia que existe pinheiro macho e pinheiro fêmea.
- Eu também não sabia, filho.
Ihh... aprendi tanta coisa cuidando dessa praça!
Hoje conheço os cantos dos passarinhos, as épocas de floração de cada planta, e vejo a passagem das estações como se fosse um filme!
- Mas ela vai demorar pra dar pinhões, hein? - falei, olhando a pinheirinha ainda da nossa altura.
Ele respondeu que não tinha pressa.
- Nossa neta é criança e eu já falei pra ela que é ela quem vai colher os pinhões.
Sem a prefeitura saber... e a Alice falou que, de cada pinha que ela colher, deve plantar pelo menos um pinhão em algum lugar.
Assim, no fim da vida, ela vai ter plantado um pinheiral espalhado por aí.
Sem a prefeitura saber, é claro, senão podem criar um imposto pra quem planta árvores...
- É admirável ver alguém com tanta idade e tanta esperança!
Ele riu:
- Se é admirável eu não sei, filho, sei que é gostoso.
E agora, com licença, que eu preciso pegar a Alice pra gente caminhar.
Vida de desaposentado é assim: o dinheiro é curto, mas o dia pode ser comprido, se a gente não perder tempo!

14 de mai. de 2012

Garota de Ipanema





A música Garota de Ipanema foi escrita originalmente com o nome de “Menina que passa” porém  nem Tom, nem Vinícius gostaram da letra. Ambos frequentavam o bar Veloso, hoje chamado Garota de Ipanema, e nas mesas que ficavam na calçada Vinícius reescreveu a letra inspirado na garota Heloísa que passava frequentemente em frente ao bar.
Adoro ir aos lugares que já foram frequentados por pessoas que admiro, poetas, pintores, escritores, fotógrafos, artistas. Imaginar eles andando, frequentando os lugares, ocupando os espaços, observar o que poderia ter lhes inspirado ou despertado seu processo criativo.
E estando em Ipanema não poderia deixar de ir ao tão famoso bar e claro, imaginar a cena.

Garota de Ipanema
Tom Jobim e Vinícius de Mores

Olha que coisa mais lindaMais cheia de graça
É ela menina
Que vem e que passa
No doce balanço, a caminho do marMoça do corpo dourado
Do sol de Ipanema
O seu balançado é mais que um poema
É a coisa mais linda que eu já vi passarAh, porque estou tão sozinho
Ah, porque tudo é tão triste
Ah, a beleza que existe
A beleza que não é só minhaQue também passa sozinhaAh, se ela soubesse
Que quando ela passa
O mundo inteirinho se enche de graça
E fica mais lindo
Por causa do amor